terça-feira, 23 de janeiro de 2018

INDIGNAÇÃO

 

 
Quando vemos os cartazes onde se alerta para a violência sobre as crianças, sobre os idosos e sobre as mulheres, há um pormenor que nos falha ... A vitimização da mulher resulta de algo que não é apenas uma etapa da vida.
A mulher é vítima de vários estereótipos, nomeadamente, o de ter nascido para se sacrificar pelos outros, sejam estes os filhos ou o marido.
No caso dos filhos, este sacrifício é notório na separação, que antecipa um processo de regulação das responsabilidades parentais.
A mulher na separação fica quase sempre com os filhos, com a responsabilidade de cuidar destes e de prover ao seu sustento sozinha.
Regra geral, o pai só intervém quando notificado pelo tribunal para uma conferência de pais, na sequência da instauração de uma ação judicial de fixação da regulação das responsabilidades parentais por parte da mãe.
A pensão de alimentos é fixada, de acordo com as necessidades dos filhos e com os rendimentos do pai.
Se cada filho necessitar (a título de exemplo) de 200,00 € (duzentos euros) mensais para sobreviver com o mínimo de condições, sendo 100,00 € (cem euros) da responsabilidade de cada um dos pais, mas o pai apenas pode contribuir com 75,00 € (setenta e cinco euros), quem compensa o remanescente em falta? A mãe. Que até pode auferir rendimentos inferiores aos do pai.
Acresce ainda, que nunca é tido em conta o facto do pai auferir subsídio de férias e subsídio de Natal, porque é que nesses meses não se fixa o dobro da pensão de alimentos?
Mas há também aqui algo, que todos se esquecem ... Mesmo que o pai contribua com uma pensão de alimentos minimamente digna, quem cozinha, lava a roupa, passa a roupa, limpa a casa, propiciando um ambiente confortável, limpo e saudável, para os filhos? A mãe.
Quem fica sem dormir quando os filhos estão doentes e os leva ao hospital? A mãe.
Quem ajuda a fazer os trabalhos de casa e orienta os filhos na escola, zelando pelo cumprimento dos seus deveres? A mãe.
É tudo muito bonito, quando vemos os anúncios de fraldas na televisão, cujo conteúdo é sempre azul, mas sabemos que o verdadeiro conteúdo da fralda não é azul ... E quando a fralda nem sempre resguarda, quem vai limpar o que sai por fora e por vezes tem de mudar toda a cama, mesmo a meio da noite? A mãe.
Convém alertar (saindo um pouco fora do tema), quem elabora os anúncios publicitários dos pensos higiénicos e dos tampões, que o período menstrual também não é azul ...
Ou seja, a mãe sacrifica a sua vida pessoal, profissional e até relacional, em proveito dos filhos. Já o pai raramente o faz.
Convenhamos, que não é nos fins de semana alternados, que regra geral são fixados para os filhos estarem com o pai, que este vai cumprir com todas as responsabilidades acima descritas ... Isto quando realmente está com os filhos, quando não os deixa aos cuidados da avó paterna ...
E não é com a pensão de alimentos, que o pai liquida mensalmente, que compensa a dedicação com que as mulheres cuidam dos filhos, a responsabilidade pela sua saúde, pelo seu futuro na escola e na vida.
Existem casos também muito frequentes, de pais que deixam de trabalhar por conta de outrem, para não terem comprovativos dos seus rendimentos, com o único intuito de se esquivarem ao pagamento da pensão de alimentos ...
Por isso hoje em dia, as mulheres estão indignadas ...
Indignadas com os tribunais, que fixam pensões de alimentos miserabilistas a cargo do pai e que se esquecem de quem paga o remanescente em falta para o sustento dos filhos ...
Indignadas por abdicarem de toda uma vida em proveito dos filhos e sem apoio do pai destes ...
Indignadas por estarem sempre cansadas, tristes e nunca terem um momento só seu ...
E acima de tudo, indignadas por não poderem ter estes pensamentos em voz alta, porque são logo apelidadas de mães egoístas, comodistas, de não pensarem nos filhos em primeiro lugar ...
E indignadas por os pais não passarem por nada disto e serem pais com iguais direitos e muito menos deveres e de nunca serem censurados por não pensarem nos filhos em primeiro lugar ...
Claro, que existem verdadeiros pais, que têm o direito de não concordar com este texto, mas lamento informar, que são casos muito excecionais.
Para estes pais, deixo um apelo, tentem influenciar todos os outros pais, chamando-lhes a atenção para as suas responsabilidades, para os seus deveres e para as contrapartidas que retiram, participando no seu crescimento, na sua educação, na sua vida.
 
Xénia Leonardo – Jurista da UMAR Açores
 
Publicado no jornal Diário Insular de 5 de Janeiro de 2018
 

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