quarta-feira, 19 de dezembro de 2012

Destaque do Mês de Dezembro de 2012

Paula Lima
“Cada palavra de alguma importância é potencialmente o ponto de interação de um número infinito de histórias (…) Este facto demonstra a riqueza da língua (…) mas também uma fonte inesgotável de incompreensão, de mistificação de manipulação. (…) a história surge sempre num contexto social e cultural. Isto significa paralelamente a uma determinada história existem outras histórias, nas quais a função da primeira é analisada criticamente no seu contexto.” (Nijk 1978, pp.115 e 180)

Paula Maria Ficher Lima, de 41 anos de idade, natural da freguesia de São Mateus, foi a primeira mulher motorista de pesados de passageiros na Empresa de Viação Terceirense, na qual trabalha há 7 anos.
Aos 30 anos, a motorista dos minibus travou durante 4 anos um longo percurso até conseguir chegar ao seu local de trabalho, como a própria refere, “quando cheguei á EVT, houve uma grande admiração quando pedi a inscrição e referi que esta era para mim, disseram-me que não tinha experiência e que até ao momento nunca tinham contido para trabalhar na empresa como motorista uma mulher. Ao longo de 4 anos vi a entrar pessoas com experiencia igual à minha e, sempre que me dirigia à empresa para saber da minha situação era sempre referido a minha falta de experiência. Foi um percurso complicado mas com persistência e pressão de certa forma da minha parte, após quatro anos de espera aceitaram-me e foi assim, que consegui vencer esta batalha”.
A 21 de Junho de 2005, Paula Maria Ficher Lima com 34 anos de idade, finalmente torna-se a primeira mulher a entrar para a EVT como motorista de pesados de passageiros, mas refere, que trabalhar num “mundo” maioritariamente masculino não é fácil, “pois, se já é difícil quando se é novo num trabalho, então quando se é mulher, mais difícil se torna, mas, com cuidado no diálogo, na perseverança e na exigência do respeito, consegue-se afirmar o nosso espaço entre os outros. Desta forma, à que saber ouvir quem está há mais tempo na profissão, aceitando as suas opiniões, ainda que estas sejam divergentes das minhas e, é deste modo, que deixam de ver-me de certa maneira como mulher e, passam a olhar como “um” colega cuja, a profissão é a mesma”.
Afirma, que apesar de ser a primeira mulher a trabalhar como motorista na EVT, foi bem recebida pela empresa e principalmente pelos passageiros, lembra-se da curiosidade e admiração das pessoas, referindo que,“faziam imensas perguntas e, muitas mulheres davam-me os parabéns, por ser a primeira mulher motorista, era um orgulho, diziam elas”.
Segundo a entrevistada, uma das suas principais dificuldades foi a farda, “sendo esta masculina tive de adaptá-la e até, de certo modo, criar a minha própria farda de acordo com os padrões exigidos pela EVT, tentando de certo modo torná-la mais feminina”.
No exercício da sua profissão nunca sentiu que a sua credibilidade fosse colocada em dúvida mas, infelizmente, já se sentiu muitas vezes discriminada por ser mulher, referindo que, “é pena que na nossa sociedade as mulheres sejam ainda discriminadas, uma vez que são dadas mais oportunidades de trabalho aos homens”.
Para finalizar, à pergunta, como acha que são vistas as mulheres vítimas de violência doméstica pela sociedade em geral, a entrevistada refere, “que a nossa sociedade cada vez mais perde valores, a sua ignorância rege-se pelo facto de não existir interajuda para com os outros. Estamos cada vez mais numa sociedade que é conduzida apenas por juízos de valor. A prova disto é o próprio“sistema” de proteção que envolve a vítima de violência doméstica, na minha opinião, é a primeira a discriminar a própria mulher e, explico o porquê de pensar assim, pelo facto de ser a vítima a ter de sair de casa e, em muitas das vezes sem ninguém (amigo ou familiar) para a apoiar, outro exemplo, encontra-se presente nas várias tentativas de denuncia feitas pela vitima que faz com que muitas das vezes não sejam levadas a sério, entre outros exemplos e, para isso não encontro nenhuma resposta social, apenas vejo, o apontar de um dedo”.

Entrevista realizada por Lisete Medeiros
Publicado na página Igualdade XXI no jornal Diário Insular de 19 de Dezembro de 2012.

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